Ana Sílvia Couto de Abreu
No processo de escrita, coloca-se a questão: para quem se escreve, na escola? A resposta implica um repensar práticas e teorias que embasam o trabalho com textos, em qualquer que seja o nível ou a disciplina.
"Tenho um bloqueio para pôr as idéias no papel?"; "não tenho idéia de como começar?". São falas de alunos que revelam um sujeito ainda não inscrito no processo de autoria. E uma reflexão se coloca: quais as propostas oferecidas ao aluno? Quais concepções estão subjacentes às práticas de produção textual?
O que pretendo é discutir de que maneira os ambientes virtuais podem contribuir com o processo de produção de textos em uma perspectiva na qual a autoria seja realmente contemplada.
Escrever para ser lido apenas pelo professor e por ele avaliado é, sem dúvida, uma tarefa que coloca o aluno na posição de alguém que para dizer precisa de autorização, precisa de um outro que "tudo sabe" para lhe dar o aval de ser capaz de se expressar.
Parece-me que aí reside um ponto de impedimento para o aluno, já que suas palavras terão um alcance restrito, com um objetivo também restrito. Evidencia-se, assim, uma concepção de produção de texto como mero atendimento a padrões preestabelecidos, sendo esses, na maioria das vezes, os da adequação à norma padrão e à estrutura textual.
O que minha prática vem demonstrando é que trabalhar produção de textos em uma abordagem em que o professor é o centro de todo o processo não leva o aluno a uma concepção de autoria, mas a uma concepção de escrita como uma atividade da ordem da técnica apenas.
Descentralizar as práticas (Abreu, 2000) parece-me a saída. O que venho pontuando é que a intersubjetividade, enquanto constitutiva do discurso, merece seu lugar de destaque no processo de aprendizagem. E, nesse sentido, é preciso que as palavras do aluno sejam postas em circulação, até para que tenham um retorno, além daquele dado pelo professor.
Os ambientes virtuais ganham assim significação, porque neles a interatividade e o alcance de maior número de leitores é uma forte possibilidade. Criar propostas que impliquem o compartilhar das idéias do aluno em um blog ou através da criação cooperativa de textos via e-mail são algumas das maneiras de colocar o aluno em diálogo, valorizando as diferenças; acreditando com Bakthin (1995) que: "não tomo consciência de mim mesmo senão através dos outros, é deles que eu recebo as palavras, as formas, a tonalidade que formam a primeira imagem de mim mesmo. Só me torno consciente de mim mesmo, revelando-me para o outro, através do outro e com a ajuda do outro".
O uso do aparato tecnológico traz uma nova dimensão para o trabalho com produção de texto na escola (Abreu & Penteado, 2003). Se isso pode se dar no ensino presencial, penso que, quando as propostas se configuram em um curso nos moldes da EAD, essas possibilidades se intensificam, sendo o princípio da intersubjetividade essencial.
Cabe, nesse caso, oferecer plataformas com ferramentas que valorizem a interlocução para considerar as trocas feitas pelos alunos como construção de um saber. Conhecer esses dizeres dos alunos faz parte do processo de avaliação formativa essencial em uma proposta de EAD que se queira séria. Criar projetos em que a busca de dados na Internet seja uma constante, trazendo como retorno o aprendizado do tratamento da informação e a valorização da alteridade.
Esses são alguns caminhos que vejo como merecedores de um olhar mais cuidadoso de nossa parte.
* Ana Sílvia Couto de Abreu, Drª. em Educação e Mestre em Lingüística Aplicada (Unicamp)
anasilvia_abreu@yahoo.com.br
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário